sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Testemunhas de Jeová vão a júri popular por morte de filha.

*Vi esse post  na comunidade do ORKUT e achei interessante colocá-lo aqui também. 

SBT Brasil
publicado em 18/11/2010 às 20:48

A MENINA TINHA ANEMIA FALCIFORME.

Bíblia, atos dos apóstolos: "Vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do sangue" , é nessa frase que se baseia a igreja Testemunha de Jeová para proibir as transfusões de sangue.Mas para a Constituição do Brasil, a vida é um direito inviolável. Os 2 códigos envolvem a discussão sobre a morte, há 17 anos, em um hospital de São Vicente, no litoral paulista. A menina, de 13 anos, precisava de uma transfusão de sangue, mas a família, Testemunha de Jeová, não autorizou.
Vejam o vídeo:

 *Já vi um caso desses no HEMORIO, uma criança precisava de transfusão e a mãe não autorizava. O pai que não era da religião autorizou, mas o médico já estava disposto a fazer a transfusão sem a autorização. A mãe gritava e chorava dizendo que preferia ver a criança morta a ter que fazer a transfusão, ela teve que ser contida e retirada do local pelo pai da criança. Um absurdo!  

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Lateral baiana tem gene da anemia falciforme e foi cortada da Seleção Brasileira

A atleta recebeu a notícia na Granja Comary, quatro dias antes de embarcar para o Equador com a Seleção Brasileira

 

18.11.2010 | Atualizado em 18.11.2010

Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO

A lateral-esquerda Fafá, do São Francisco, vive um drama. Aos 19 anos, descobriu que é portadora do traço falcêmico, uma alteração sanguínea hereditária que a proíbe de jogar na altitude.
A atleta recebeu a notícia na Granja Comary, quatro dias antes de embarcar para o Equador com a Seleção Brasileira, onde disputaria o Sul-Americano. “O médico me chamou com toda a comissão técnica. Disse que poderia seguir a carreira, mas que não poderia jogar na altitude”.
Cortada do grupo, Fafá não conseguiu conter as lágrimas. “Foi como se perdesse um parente próximo. Eu vinha treinando bem”, lamenta. Fafá teve o sonho interrompido. Depois de passar pelas categorias de base, vestiria a amarelinha no time principal pela primeira vez.
Perigo
O corte foi para protegê-la. “Quem tem o traço tem algumas hemoglobinas com formação defeituosa e a função delas é transportar oxigênio. Em grande altitude existe a diminuição da quantidade de oxigênio na atmosfera e, por isso, ela teria dificuldade de respirar, dor articular, poderia fazer trombose e ter sangramentos”, explica o vice-presidente médico do Bahia, Marcos Lopes.
Fafá tenta se recuperar da decepção. Onde? Dentro de campo. “O baque foi grande, mas eu pretendo continuar no futebol. Agora só penso em ser decacampeã (dez vezes) pelo São Francisco”. Amanhã, ela defende o time na final do Baiano. Pega o Flamengo de Feira, 15h30, em São Francisco do Conde. Na ida, deu 2x0.
Daniela Leone | Redação CORREIO

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Minha infância

Hoje relembrei meus tempos de infância...
Houve um tempo em que minha imaginação acreditava que cada dia poderia ser melhor do que o outro, um tempo em que a vida era cheia de sonhos e magias; um tempo em que achava que o futuro poderia ser perfeito, que a cura chegaria. Esse tempo existiu. E em minha infância e juventude, em minha inocência e esplendor assombrados, senti que fora aberto um caminho para mim onde poderia levar a vida convivendo com a Anemia falciforme e sobreviver vencendo cada dia ou deixar a AF levar a minha vida.
 Meus pais a partir de seus 22 anos quando descobriram a AF em seus dois filhos (imagino a cabeça deles nessa época sendo tão jovens) tentavam de tudo, batiam no liquidificador fígado crú com feijão fervente e me faziam tomar a força achando que evitariam as crises da AF. Até a próxima consulta com a pediatra do HEMORIO onde eles relatavam o que me faziam tomar, eu sofria um bocado com essa receitinha horrorosa, aí vinha então a descoberta de que eu não precisava de ferro e às vezes tinha até excesso. Passaram então a perguntar antes à médica para depois fazerem as receitinhas, me foi liberado chá de picão, suco de jenipapo, mastruz com leite e outros chás, sempre lembrando-os que somente nos hidrataria. Mesmo assim as crises da AF apareciam, uma doença genética como essa não é resolvida tão simplesmente assim, mas alguns cuidados pode adiá-las por mais um tempo. Se chovia lá estava eu de meias, botas e casaco na escola, muitas vezes somente eu aparecia assim, a coordenadora da escola passou até a me perseguir pelo uso da bota que não fazia parte do uniforme, embora fosse preta  e eu tinha que ficar me explicando.
Festinhas de aniversário dos coleguinhas só podia ir se não chovesse e se não estivesse frio, eu até compreendia bem mas ficava triste, ainda mais que lá em casa a dose da AF era dupla (eu e meu irmão). Sorvete só fui experimentar lá pelos 8 ou 9 anos porque minha mãe tinha medo de nos oferecer qualquer coisa gelada, então eu e meu irmão combinamos em fazer essa pergunta a pediatra, que nos liberou em dias de muito calor. Passei a amar esses dias ensolarados, podia ir a praia tomando alguns cuidados, sorvete a vontade e usar roupas leves. Por isso quando chegava o verão eu era toda FELICIDADE e até hoje é a estação que me sinto melhor. Não tive uma infância cheia de brincadeiras e aventuras, até mesmo porque eu não me sentia bem com as brincadeiras de pega-pega, pique e correrias, me cansava facilmente e morria de vergonha de ficar "colocando os bofes pra fora" por qualquer coisinha frente as outras crianças, então eu evitava. Bem diferente de meu irmão que brincava mais e se aventurava mais, pois demorava  para se cansar e não tinha crises de dores, ele sofria mais com a icterícia (que o fez receber o apelido de Amarelão) e com o crescimento lento que sempre o levava a questionar nossa saudosa pediatra Drª Iracema Labanca. Nesse período de vida somente fiquei internada 1 vez por 12 dias com infecção urinária e meu irmão 2 vezes incluindo um Natal, mas na emergência várias vezes com dor precisei fazer transfusão, às vezes a transfusão era tb em dose dupla e eu e meu irmão, em nossa inocência, ao chegarmos em casa ficávamos como bobos apertando as bochechas para ficarmos rosados como nossos coleguinhas.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

AF não é doença racial.


Anemia falciforme: uma doença geográfica

Colunista desconstrói a noção muito difundida de que essa seria uma “doença racial”
Por: Sergio Pena
Publicado em 11/04/2008 | Atualizado em 11/12/2009

Todos sabemos que doenças humanas não só têm importância médica, como também fortes simbolismos sociais e culturais. A maneira como as enfermidades são percebidas e descritas influencia o modo como elas são diagnosticadas e tratadas, assim como a estigmatização dos pacientes. Gosto muito de ilustrar isso com o exemplo do raquitismo, doença que nos Estados Unidos foi originalmente categorizada como um problema nutricional (por deficiência da ingestão de vitamina D) e, na Inglaterra, como enfermidade ambiental (por deficiência de luz solar para a síntese de vitamina D pela pele).
As hemácias em formato de foice (“falciformes”) foram descritas pela primeira vez por Herrick, em 1910, em um paciente negro.
Na coluna de março apresentei dados históricos que demonstram o importante papel da anemia falciforme na gênese do conceito de “doença molecular” e na evolução da medicina genômica. Agora, quero questionar a conceituação da anemia falciforme como “doença racial” e apresentá-la como uma “doença geográfica”, uma visão mais moderna e correta.

A percepção da anemia falciforme como uma doença de negros é antiga. A descrição dessa enfermidade data de 1910, quando o médico americano James B. Herrick (1861-1954) apresentou o estudo de um único paciente negro no qual identificou as células vermelhas do sangue com formato de foice.

Em 1923, o pediatra Virgil Preston Sydenstricker (1889-1964) publicou um artigo chamando atenção para o fato de a doença ser familial, afetar igualmente os dois sexos e provavelmente acometer apenas pacientes negros. A partir de então, firmou-se no cânone médico a conexão entre anemia falciforme e “raça negra”.

A associação inicial da doença com uma “raça” teve conotações políticas e ocorreu como parte do fenômeno de “patologização” do negro americano, bem descrito por Melbourne Tapper em seu livro In the blood: sickle cell anemia and the politics of race (“No sangue: anemia falciforme e a política racial”). Posteriormente, na década de 1970, a conexão foi adotada paradigmaticamente pelo movimento negro americano, em especial pelo cardiologista Richard Williams no seu livro Textbook of black-related diseases (“Livro-texto de doenças do negro”).

É curioso que o co-autor de Williams nesse tratado tenha sido nada mais, nada Martin menos que o notável ativista Luther King (1929-1968), Nobel da Paz em 1964, que não era médico. Sua participação nos remete à importância social e cultural das doenças e às conseqüências da forma como elas são percebidas e apresentadas.

Minha tese nesta coluna é que, como biologicamente não existem raças humanas (tema discutido aqui ), é inaceitável o paradigma de “doenças raciais”, que reforça a visão errônea de que há diferenças biológicas entre pessoas negras e brancas. A distribuição populacional da anemia falciforme e especialmente a sua maior prevalência em indivíduos negros não tem nada a ver com raça, mas sim com geografia. Para melhor entender isso, vamos ter de fazer um détour genético.

Evolução e doenças infecciosas

O grande cientista inglês J.B.S. Haldane (1892-1964), um polímata. Haldane começou sua carreira científica como professor de fisiologia na Universidade de Oxford, onde fez pesquisas importantes sobre fisiologia humana subaquática. Transferiu-se, depois, para a Universidade de Cambridge como professor de bioquímica, tendo gerado contribuições fundamentais sobre cinética enzimática. Posteriormente, foi como professor de genética para o University College em Londres, onde ajudou a criar a genética de populações moderna. Haldane foi um comunista ativo e escreveu uma coluna de ciência no jornal Daily Worker. Na década de 50, desencantado com o imperialismo militar britânico, mudou-se para a Índia e aderiu ao budismo jainista.
O grande geneticista-bioquímico-fisiologista-ativista político inglês J.B.S. Haldane (1892-1964) é um dos meus ídolos. Já mencionei seu nome em uma coluna anterior , como um dos pais da nova síntese evolucionária, ou seja, da compatibilização entre Darwin e Mendel que ocorreu na primeira metade do século 20.

Durante décadas, Haldane escreveu semanalmente sobre ciência no jornal Daily Worker, publicação oficial do Partido Comunista inglês. De acordo com John Maynard-Smith (1920-2004), outro importante geneticista inglês, Haldane era “superlativo” como popularizador da ciência, porque captava conexões que ninguém havia percebido antes.

Em 1949, Haldane proferiu uma conferência na Itália e realçou, aparentemente pela primeira vez, o fato de que as doenças infecciosas têm um papel evolucionário importantíssimo como agentes seletivos. Por anos eu tentei em vão conseguir o artigo com o texto dessa famosa conferência, publicado no inacessível periódico italiano La Ricerca Scientifica.

Só muito recentemente tive sucesso, graças a uma reedição do texto na revista indiana Current Science (acesse o texto clicando aqui ). O artigo é genial – Haldane em sua melhor forma! Vejam um pequeno trecho, de simplicidade cristalina (minha tradução):

“Provavelmente uma alteração bioquímica muito pequena pode conferir a uma espécie hospedeira um grau substancial de resistência a um parasito bem adaptado. Isto tem um importante efeito evolucionário. Significa que é vantajoso para o indivíduo possuir um fenótipo bioquímico raro [...] E significa, também, que é uma vantagem para a espécie ser bioquimicamente diversa e mesmo mutável em referência a genes envolvidos na resistência às doenças.”

Haldane propôs, adicionalmente, que a seleção de fenótipos bioquímicos raros não era apenas de importância na manutenção da variabilidade dentro das espécies, mas devia ser também um mecanismo de especiação.

A hipótese da malária
Um ano antes dessa conferência de Haldane, James Neel (apresentado na coluna de março ) havia feito uma proposta, trabalhando dentro do paradigma de “doença racial” da anemia falciforme. Neel postulou que a alta freqüência dessa doença em negros americanos e africanos e também da talassemia em populações mediterrâneas (ver também coluna de março) refletia uma alta taxa de mutação do gene da hemoglobina nesses grupos étnicos distintos.

Haldane discordou. Como relatado por Giuseppe Montalenti em um adendo ao artigo de 1949, ele, informado da alta freqüência de heterozigotos da talassemia em regiões endêmicas de malária no sul da Itália, propôs que, como as hemácias dos heterozigotos para a talassemia eram menores, esse fato os tornaria mais resistentes à parasitose. Nascia assim a “hipótese da malária”, cuja primeira confirmação foi feita não em estudos de talassemia, mas da própria anemia falciforme.

Em 1954, o médico inglês Anthony C. Allison publicou resultados de sua pesquisa sobre malária e anemia falciforme em Uganda. Ele observou que, em crianças pequenas com malária, as densidades do parasita Plasmodium falciparum no sangue eram quatro vezes menores em heterozigotos AS do que em homozigotos normais AA. Ele calculou que as crianças AS tenham uma chance 76% maior de sobreviver ao primeiro ataque de malária do que crianças AA. 

Mapa mostrando a impressionante sobreposição geográfica da malária falciparum, da anemia falciforme e da talassemia (clique na imagem para ampliá-la).
Mais tarde a hipótese da malária foi sacramentada pela óbvia correspondência geográfica entre a prevalência da malária causada pelo Plasmodium falciparum e a freqüência do gene falciforme na África (ver figura). Observe-se que o gene da anemia falciforme (alelo beta S ) não é visto nas populações de regiões geográficas da África nas quais a malária não é endêmica.

Por exemplo, ele está ausente nas populações das regiões altas da Etiópia (Tigre, Falasha, Amhara e Galla), nos Masai, Kamba e Chaga do Quênia e da Tanzânia, nos bosquímanos e hotentotes da parte sul da África e nos Shona, uma população de língua banto do Zimbábue. Em outras palavras: a presença do gene não tem nada a ver com cor ou ”raça”, mas com geografia.

Doenças genéticas e geografia
Por outro lado, além da África subsaariana, o alelo beta S e a anemia falciforme podem ser vistos na África do Norte, Grécia, Itália, Oriente Médio, Península Arábica, Índia e até na China (ver figura). A razão dessa ampla distribuição ficou mais clara com os avanços em genética molecular humana.

Estudos de marcadores genéticos que flanqueiam o gene da beta-globina mostraram que, na verdade, aconteceram várias mutações beta S independentes que se estabeleceram em populações expostas à malária falciparum. Quatro das mutações ocorreram na África e receberam os nomes das respectivas regiões geográficas em que se fixaram: tipo Senegal, tipo Camarões, tipo Benin e tipo República Centro-africana (também chamada tipo Banto). A quinta mutação beta S , denominada tipo Árabe-Indiano, não ocorre na África e sim, como o nome indica, na Ásia Menor e Índia.

Deve ficar bem claro, então, que a anemia falciforme não é uma "doença de negros" nem uma “doença africana”, mas sim uma doença eminentemente geográfica, produto de uma estratégia evolucionária humana para lidar com a malária causada pelo Plasmodium falciparum.

A talassemia é uma doença também geográfica, que afeta populações da África, do Mediterrâneo e da Ásia (ver figura) e representa uma estratégia evolucionária alternativa para resistência à malária.

Analogamente, a fibrose cística (mucoviscidose) é outra doença geográfica, desta vez européia, que emergiu como uma provável estratégia evolucionária de resistência à febre tifóide. Já a doença de Tay-Sachs, especialmente vista em judeus asquenazitas, parece estar ligada à resistência à tuberculose.

Mas deve ficar claro e evidente que a fibrose cística não é uma “doença européia”, nem a doença de Tay-Sachs é uma “doença judaica”. Altas freqüências da fibrose cística, por exemplo, já foram observadas em algumas populações do Oriente Médio e da África e a doença de Tay-Sachs é vista em elevada freqüência em canadenses franceses da província de Quebec.

Podemos, com esses exemplos, perceber o papel fundamental das doenças infecciosas na evolução do genoma humano e a notável importância do território endêmico dessas enfermidades na seleção de certos genes em determinadas populações humanas. É totalmente desnecessário invocar conceitos arcaicos como “raça” e “doenças raciais” para explicar a variação de prevalência de doenças genéticas em diferentes grupos continentais. A geografia explica tudo.


Sergio Danilo Pena
Professor Titular do Departamento de Bioquímica e Imunologia
Universidade Federal de Minas Gerais
11/04/2008

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Pesquisas e esperança.

Modulador de hemoglobina fetal pode mudar destino de doença falciforme

Células vermelhas do sangue começaram a produzir mais a hemoglobina fetal

A bióloga molecular Dorothy Y.H. Tuan e o pesquisador Wenhu Pi descobrem tratamento para anemia falciforme.
Os pesquisadores responsáveis pelo estudo durante pausa na pesquisaUm aposentado, mas bem conservado mecanismo de regulação vírus que já trabalhou seu caminho para o genoma humano parece modular uma alternação entre o adulto e a produção de hemoglobina fetal.
Essa opção pode ser a chave para terapias mais específicas para pacientes com anemia falciforme, cuja hemoglobina adulta dificulta a sua capacidade de fornecer oxigênio por todo o corpo. Hemoglobina fetal, por outro lado, não pode tomar a forma disfuncional foice.
Depois de eliminar o modulador, ERV-9, em ratos de laboratório que expressam a hemoglobina humana, os pesquisadores descobriram que células vermelhas do sangue começaram a produzir mais a hemoglobina fetal, o que seria ideal para pacientes com anemia falciforme, disse Dorothy YH Tuan, bióloga molecular na Escola de Medicina do magnetocardiograma e Pós-Graduação. Ela é autora correspondente no estudo publicado no PNAS, em parceria com Wenhu Pi, cientista assistente da pesquisa no MCG.
A hemoglobina fetal recupera de oxigênio do sangue da mãe. Logo após o nascimento, os bebês começam a produzir hemoglobina do adulto.
É uma mudança dramática - perto de 100% - e quando os pesquisadores tentam aumentar o nível de qualquer tipo de hemoglobina, o tipo de outro desce. "É sempre um ioiô. Devem estar competindo por alguma coisa", disse Tuan.
Ela acredita que o concurso é para fatores de transcrição NF-Y e GATA-2, proteínas que se ligam e ativam os genes da globina fetal e adulto.
Tuan tem evidências de que ERV-9, atualmente visto como DNA lixo no corpo, desempenha uma função crítica no sentido de garantir a produção de hemoglobina adulta.
Sem ERV-9, o gene da hemoglobina do adulto não é tão competitivo para os fatores de transcrição - NF-Y e GATA-2 - que precisa ser altamente expressa.
"Queremos estudar células vermelhas do sangue fetal e ver o que ERV-9 está fazendo lá", disse Tuan. Ela também quer entender melhor ERV-9 aparente capacidade de suprimir genes da globina estudando como, durante o desenvolvimento, seu próprio DNA é quimicamente alterado em um processo chamado epigenética.
O DNA tem quatro bases químicas - A, G, C e T - e ERV-9 de DNA contém uma grande quantidade de C, ou citosina, que é facilmente alterada quimicamente. O efeito líquido da alteração química - parte do desenvolvimento normal - é a supressão do gene.
Se sua hipótese é correta e os genes fetais e adultos estão competindo para NF-Y e GATA-2, o que acontece se houver uma maior oferta desses fatores de transcrição? "Se você pode aumentar a NF-Y e GATA-2 por isso há muito por aí, talvez ambos beta e gama genes serão ativados sem suprimir um do outro", disse Tuan.
Hidroxiuréia, uma droga usada para tratar a doença falciforme, aumenta a porcentagem de hemoglobina fetal em alguns pacientes, mas é uma ação indireta que vem com muitos efeitos colaterais. As novas descobertas levaram a especular se hidroxiuréia ativa o gene gama fetal, através do aumento da oferta de NF-Y e / ou de GATA-2 em células vermelhas do sangue, em seguida, projetar as drogas diretamente para aumentar a quantidade de fatores de transcrição, produziria o mesmo benefício com menos efeitos colaterais.
Tuan observa ainda que os milhares de cópias de ERV-9 encontrados nos cromossomos humanos ajudam provavelmente modulam a atividade de outros genes.
Fonte: Isaude.net

sábado, 13 de novembro de 2010

O desconhecimento médico me assusta...

   Ontem passei por uma perícia e o médico perito que me atendeu ao ver meus exames e o diagnóstico de Anemia Falciforme, olhou-me de cima abaixo e exclamou espantado: __ Você tem Anemia Falciforme? Você tem ascendência negra?! ( o estigma de "doença de negros" continua...). Tive quase que dar uma aula sobre minha ascendência e explicar a ligação da Europa com o Norte da África pelo Mediterrâneo de onde provavelmente os genes SS veio parar até mim. Então ele olhou meu sobrenome e disse que deve ter vindo dos Mouros e riu, ri também e resolvi ficar calada porque senão teria que explicar a origem da família Moura que não tem nada a ver com Mouros. Por fim, perguntou se eu usava medicamentos com suplemento de Ferro (parece que ele não sabe que a AF não é uma anemia ferropriva). Mais uma vez tive que explicar que meus exames apresentam de vez em quando a ferritina elevada e não posso fazer uso de ferro, devendo até mesmo controlar minha alimentação nesse quesito.
   Ah! Se ele visse então o menino filho de chineses que tem Anemia falciforme no HEMORIO, iria achar que estava em Marte!

   Qualquer dia postarei a origem da Família Moura.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Mitos sobre a doença falciforme na Àfrica.

   Uma das histórias mais conhecidas relacionando a evolução humana e a anemia falciforme se refere à palavra ogbange muito difundida na África e que indica reencarnação de um processo maligno (entenda-se, no caso, como a anemia falciforme). Assim, referia-se a uma criança doente, com as características típicas da anemia falciforme: icterícia, fraqueza, dores articulares, inchaços das mãos e pés, úlceras de pernas, etc., como criança-obgange. Esse fato era tido como um espírito que atormentava crianças de determinadas famílias – fato que relacionava-se com a hereditariedade da doença. De acordo com Konotey-Ahulu, de Gana, médico que estudou profundamente o comportamento de doentes com anemia falciforme, a doença já era conhecida por várias gerações de pessoas da região ocidental da África, onde a anemia falciforme recebia nomes com significados relacionados à dor, icterícia, inchaços das mãos e pés, etc.
 – Lista de palavras africanas para se referir às características da doença falciforme (dor, úlceras, inchaços, etc.) em diferentes dialetos.
Palavras de referência à DF (1)
Chwe-Chwe-Chwe (2)
Nwii-Nwii (2)
Amosani (3)
Aju-oyi (4)
Nui-Dudui (2)

*(1) DF: Doença falciforme;(2) Imitação do choro de criança provocado por dor;(3) inchaços;(4) dor aguda.

Os estudos realizados em vários grupos étnicos de Gana revelaram que a anemia falciforme já era conhecida, com certeza desde o século 15, com particularidades que se caracterizavam por: crises agudas de dor nos ossos e nas articulações, e tendência familiar. Pelo fato dos pais serem aparentemente normais, difundiu-se o conceito do espírito do mal que reencarnava somente em crianças. Em outras regiões da África não foi possível estabelecer as características típicas da anemia falciforme quanto ao evidenciado entre as populações de Gana. Na Nigéria, maior nação africana, a anemia falciforme permaneceu desconhecida como doença de especificidades típicas até meados do século passado. Embora os vários dialetos nigerianos sejam ricos em palavras e expressões que descrevem vários dos sintomas comumente encontrados na anemia falciforme, esses termos não são, entretanto, específicos dessa patologia. No dialeto Haussa as expressões como rashin jini (falta de sangue), ciwon gá bó bí sai sai (dores nos ossos e articulações) e rashin kuzari (falta de energia), são freqüentemente usadas em relação à anemia falciforme pelos doentes, seus parentes e curandeiros tradicionais. Entretanto, o uso corrente destas expressões nunca foi associado à uma doença específica como a anemia falciforme. Esse drama humano, baseado no sofrimento impingido por um "castigo" devido à reencarnação de um espírito mau que marca certas famílias, permanece ainda como um mito em várias tribos africanas.


Origem e disperção do gene bs
Autor: Paulo Cesar Naoum

AF na História do Brasil.

A introdução da Hb S no Brasil.

Para descrever sobre a introdução da Hb S no Brasil é fundamental conhecer as bases que deram origem à nossa população. A população brasileira se caracteriza, em geral, pela sua grande heterogeneidade genética, derivada da contribuição que lhes deram os seus grupos raciais formadores, de si também já muito diversificados, e dos diferentes graus com que eles se intercruzaram nas várias regiões do país. O processo de miscigenação pode ser analisado sob o ponto de vista da distribuição geográfica. Os Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro e a região litorânea do nordeste apresentam, de forma mais intensa a miscigenação branco–negra. O Estado da Bahia, por sua vez, e em especial a região metropolitana de Salvador, se destaca pela predominância da população negra. Já o interior do nordeste e o extremo norte (Amazonas, Pará e parte do Maranhão) se destacam principalmente pelo processo de mestiçagem branco–indígena, fato que ainda também pode ser notado nos Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Na região sul do Brasil, e do Estado de São Paulo, há visível predominância de indivíduos da cor branca, motivados pelas diferentes correntes imigratórias de europeus, principalmente. Por se tratar da introdução da Hb S no Brasil, será dado destaque à entrada do negro africano no Brasil, subjugado na condição de escravo no período entre 1550 e 1850. A procedência da quase totalidade dos escravos africanos era de duas regiões: a Costa da Mina, que incluía o lugar conhecido na época por Cabo do Monte até o de Lobo Gonçalves, tendo em Ajudá o seu ponto principal de embarque para os "navios negreiros" – e Angola estendendo-se até o Cabo Negro, com seus três portos: Congo, Luanda e Benguela. De Luanda e Benguela provieram cerca de 2/3 dos escravos entrados entre 1700 e 1850 pelos portos do Rio de Janeiro e Pernambuco. O terço restante, recebido sobretudo pelo porto da Bahia, provinha da costa da Mina. Os negros de outras regiões africanas, como Cachéu, Cabo Verde, Moçambique e Madagascar tiveram pouca contribuição na presença do negro no Brasil.
Os negros, aqui introduzidos, eram povos de várias culturas, entretanto foram duas, a sudanesa e o bantú, que mais contribuíram na formação cultural do povo brasileiro. Os de origem sudanesa, caracterizados pela influência árabe, sobressaíram na agricultura, criação de gado, comércio, trabalhos de arte em ferro e bronze, e eram maometanos. Os de origem bantú tinham aptidões para serem obreiros de ferro e madeira, e eram feiticistas. Houve também um grupo numeroso, de cultura mista, proveniente da mistura de sudaneses e bantú – os guineanos. Vinham do golfo da Guiné, uma região entre o Sudão Ocidental e o Congo e de onde saía a cultura bantú; tinham os seguintes traços: atividades pastoril, organização social, e influência do islamismo. Os bantús foram sempre os preferidos no Brasil, por serem menos independentes, mais sujeitos à escravidão, mais reservados, loquazes e adaptáveis a diversas situações; aceitaram o cristianismo e as formas sociais que lhes foram impostas. O elemento mais característico do bantú foi o angolano. Mais altos que os outros negros, porém mais fracos, eram, no entanto, comunicativos e cordiais. Os mais inconformados eram os daomeanos (ou jejes), os nagôs e os maometanos (ou malês), provindos do norte da Nigéria. Os haussas, também nigerianos, foram os mais insubmissos como escravos, e encabeçaram todas as revoltas importantes da Bahia e de outras regiões. A ausência de dados oficiais comprobatórios sobre o volume de negros que aportaram no Brasil – motivada pela circular do Ministério da Fazenda, n.º 29, de 13 de maio de 1881, que ordenava a queima dos arquivos da escravidão – tem prejudicado sensivelmente estudos mais detalhados desse importante tema. Entretanto, Nina Rodrigues apresenta em sua memória "Os Africanos no Brasil" publicada em 1932, dados obtidos do primeiro jornal publicado na Bahia – "Idade de Ouro" – sobre o exato movimento comercial de escravos do porto de Salvador; nesse jornal figuram os números e nomes das embarcações entradas, a sua procedência e carga, e neste item se especifica sempre o número de escravos importados da África, mencionando até os que haviam sucumbido na travessia do Atlântico. Embora abranja poucos anos (1812 a 1820), o movimento de navios e escravos entrados no Brasil, segundo a procedência, era o seguinte:
__África setentrional: Mina, Ajudá, Bissao, Orim, Camarões. Todos de origem sudanesa. (17.691)
__África meridional: Congo, Zaire, Cabinda, Angola, Moçambique, Malambo, Quillemané,Zanzibar. Todos de origem bantú. (20.841)

Apesar do número apresentado de bantús ser superior ao de sudaneses, a verdade é o inverso, isto porque a partir de 1816 os ingleses iniciaram o combate à escravidão, que somados ao tratado de Paris (1817) e de Aix-la-Chapelle (1818), limitaram o comércio de escravos pelos portugueses. É em obediência a esses tratados que, de 1816 em diante, desapareceram os documentos oficiais sobre a procedência de escravos das regiões acima da linha do Equador, sem que, todavia, tivesse cessado sua importação. Assim, a importação clandestina de negros continuou, depois de 1817, tão vigorosa quanto antes. A quantidade de negros trazidos ao Brasil é bastante discutível, entretanto calcula-se que entre 1550 e 1850 entraram no Brasil entre 2.500.000 a 4.000.000 de indivíduos. Dessa forma, a Hb S introduzida no Brasil por negros africanos pertencentes a dois grupos culturais, o sudanes e o bantú, coincide com os resultados das análises de haplótipos que revelaram que o haplótipo Bantú é o mais prevalente em análises efetuadas em diferentes populações negras do Brasil, seguido do haplótipo Benin (que representa a cultura sudanesa) enquanto que o haplótipo Senegal é raríssimo.
A indicação das regiões de onde provieram os negros para o Brasil em análise a coincidência da suposição histórica da proveniência dos negros africanos para o Brasil é um fato recentemente comprovado por biologia molecular dos haplótipos da Hb S.

Dispersão da Hb S no estado de São Paulo

Raros grupos sociais no mundo podem afirmar terem suas raízes tão bem conhecidas quanto o paulista. A origem dos antepassados da população do estado de São Paulo é bem conhecida, a ponto de ser possível fazer a sua reconstituição com precisão. O planalto paulista – local onde se deu início a formação da população – era quase um vazio demográfico até a metade do século 16, onde o indígena não deixou marcas expressivas. A formação racial do estado de São Paulo teve início através de duas fundações: Santo André da Borda do Campo, constituída por povoação iniciada por João Ramalho, e a fundação jesuítica que se estabeleceu em 25 de janeiro de 1554 numa colina entre os vales do Anhangabaú e do Tamanduateí. Santo André representava um tipo populacional mameluco, enquanto que a fundação jesuítica tinha o predomínio de portugueses. Pela própria localização da cidade de São Paulo, estabeleceu-se um processo seletivo, pois o planalto paulista não oferecia possibilidades agrícolas comparáveis às da cana de açúcar do norte do Brasil, além do que o viajante precisava enfrentar a escalada difícil da serra do Mar. Um outro processo seletivo era a própria sobrevivência no planalto, ante os ataques dos índios, a fome, as doenças, e a temperatura muito baixa. Esses determinantes fizeram com que nesse meado do século 16 o estado de São Paulo permanecesse na pobreza, enquanto que o litoral do nordeste prosperasse devido ao comércio do pau-brasil, ao mesmo tempo em que se formavam pequenos núcleos populacionais. A aclimatação da cana de açúcar no nordeste brasileiro, principalmente na orla pernambucana, retardou o povoamento e a evolução da região sul do Brasil. A capitania de São Vicente, a mais próspera do estado de São Paulo, estagnara-se, e seus povoadores promoviam o apresamento do índio para o cultivo das lavouras, enquanto que o progresso propiciado pela cultura da cana de açúcar no nordeste brasileiro incentivaram o tráfico de africanos. A situação começou a mudar no final do século 16 quando os bandeirantes paulistas encontraram ouro além da serra da Mantiqueira. Por esse motivo, volumoso contingente populacional se dirigiu para Minas Gerais, e a prosperidade exigiu a mão-de-obra do escravo africano, mudando o fluxo no sentido nordeste para o sudeste do Brasil. Por quase duzentos anos o ouro foi explorado até se exaurir, causando a diminuição do progresso que duraria meio século. No início do século 19, um projeto organizado de plantação de café no estado de São Paulo revelou-se como grande propulsor de progresso social e cultural, deslocando o eixo econômico para São Paulo. Os primeiros cafezais foram plantados no vale do rio Paraíba, dando à região sete décadas de prosperidade. Nesse período foi requisitado grande contingente de escravos africanos, a ponto de representarem mais de 50% da população. Esse fato pode ser atestado no estudo realizado entre os anos de 1978 e 1982 por Naoum que mapeou as hemoglobinopatias no estado de São Paulo e relacionou a prevalência da Hb S com a presença do negro africano em suas diversas regiões. O estudo revelou que havia uma relação entre o aumento da prevalência da Hb S com o caminho trilhado pelo negro africano durante o ciclo do café. O estado de São Paulo e  dezenove cidades foram estudadas, identificando a prevalência de Hb S em cada uma delas em amostras de sangue obtidas de pessoas negras. Pela análise do estudo é possível observar que a efetiva introdução do negro no estado de São Paulo se deu inicialmente pelas cidades do vale do Paraíba. Quando as terras do vale tornaram-se inférteis para a plantação de café, o direcionamento cafeeiro tomou o sentido da extinta região Central, composta por Campinas e Jundiaí, e da cidade de Sorocaba já no final do século 19. Com a abolição dos escravos e a vinda de imigrantes italianos para as fazendas paulistas, a utilização da mão-de-obra de negros caiu rapidamente, coincidindo com o início da cafeicultura na região Mogiana e no oeste paulista, notadamente em Ribeirão Preto, Franca, Araraquara e Jaboticabal. Pela análise do mapa de prevalência de Hb S no estado de São Paulo é possível observar o declínio geográfico da Hb S no sentido oeste e norte, devido à diminuição da mão-de-obra escrava que foi substituída pelos imigrantes italianos e espanhóis, principalmente. Esse fato associado com a abolição da escravidão no Brasil promoveu o branqueamento da população paulista. Em 1872, os negros e mulatos constituíam 62% da população paulista. Com a abolição dos escravos em 1880 iniciou-se o declínio dos negros; em 1923 eram apenas 16%, em 1940 eram 14%, e em 1950 somente 11%. Entretanto, o gene da Hb S foi difundido entre os brancos que tiveram ancestrais negros, conforme mostra o estudo que relaciona a prevalência de Hb S entre as pessoas brancas nas mesmas cidades em que foram analisadas as pessoas negras. Observa-se que entre pessoas brancas o gene da Hb S está presente em todas as cidades estudadas.
- Na disposição geográfica das cidades estudadas do Estado de São Paulo referente à amostragem da população negra submetida à análise de hemoglobinas. Observa-se que a maior prevalência da Hb AS obedece "um caminho" que tem relação com a colonização do Estado de São Paulo e a utilização da mão-de-obra do escravo africano, a partir da região do vale do Paraíba em direção à antiga região central composta por Campinas, Jundiaí e Sorocaba.
 - Na disposição geográfica das cidades estudadas do Estado de São Paulo referente à amostragem da população branca submetida à análise de hemoglobinas. Observa-se que em todas as cidades do Estado de São Paulo o gene para Hb AS está presente em suas populações, indicando a miscigenação branco-negra, com maior ou menor intensidade entre as diferentes cidades.


Origem e disperção do gene bs
Autor: Paulo Cesar Naoum


Senta que lá vem História!

Origem e disperção do gene bs
Autor: Paulo Cesar Naoum

A dispersão do gene da Hb S

A dispersão do gene da Hb S pode ter ocorrido entre 50 mil e 100 mil anos quando os nossos ancestrais se deslocaram para o sudeste da Ásia e para a Austrália. Estudos antropológicos recentes revelaram que há 50 mil anos os H. sapiens sapiens se deslocaram para várias regiões da Ásia, atingindo o Oriente Médio e a Sibéria.
Por volta de 60 mil anos a migração se deu no sentido Ásia e Austrália, e há 40 mil anos a movimentação ocorreu para diversas regiões da Ásia, com destaque ao Oriente Médio e Sibéria.
Entretanto, admite-se que a expansão da Hb S se deu efetivamente no período Pré-Neolítico, entre 10 mil e 2 mil anos a.C., marcada pela miscigenação entre diferentes povos da região do Saara. Nesse período, o Saara era composto por terras férteis e com agricultura desenvolvida para o abastecimento de suas populações. No período Neolítico (3.000 – 5.000 a.C.) ocorreu a transmissão da infecção parasitária causada pelo Plasmodium falciparum proveniente da região que hoje corresponde à Etiópia. Destaca-se durante esse período o aumento do processo migratório, o assentamento de grupos populacionais e o estabelecimento de grandes centros de civilizações no vale do rio Nilo, bem como na Mesopotâmia, Índia e Sul da China. A malária se expandiu entre esses quatro principais centros, e no caso específico relacionado com a Hb S, a malária se estendeu do vale do Nilo para a costa do mar Mediterrâneo. Acredita-se, assim, que nesse período teve início a pressão seletiva favorável aos portadores heterozigotos da Hb S (ou Hb AS) frente ao desenvolvimento da doença causada pela malária. Com a desertificação do Saara, ocorrida no período Neolítico Posterior (2.000 a 500 anos a.C.), suas populações migraram para outras regiões da África, atingindo, inclusive, as regiões banhadas pelo mar Mediterrâneo. É importante destacar a explicação sobre a expansão da Hb S no período Pré-Neolítico que foi dada pelo Professor Stuart J. Edelstein em seu livro "The Sickled Cell". O professor Edelstein calcula que se a prevalência de indivíduos com Hb AS dobra a cada sete gerações, seriam, assim, 17 duplicações necessárias para se aproximar da atual prevalência de Hb AS na África envolvendo 119 gerações (ou seja 7 x 17 = 119). Se for estimado 20 anos para cada geração, resulta que a dispersão da Hb S ocorreu efetivamente há cerca de 2400 anos, a partir do momento em que a população se estabilizou alavancada principalmente pelo desenvolvimento agrícola, organização social, além do discutível fator seletivo exercido pelo Plasmodium falciparum. No período Medieval, entre os séculos 1 e 15, o gene da Hb S atingiu o leste e sudeste da Europa. Por fim, a introdução do gene da Hb S nas Américas, e especificamente no Brasil, se deu entre os séculos 16 e 19, motivado pelo tráfico de escravos africanos. Abaixo está um resumo  da evolução cronológica da dispersão do gene da Hb S.
– Evolução cronológica da mutação do gene para Hb S
Período: Paleolítico/Mesolítico. Ano: 50 mil – 100 mil anos. Evento: Ocorrência da mutação do gene bA para bS em três regiões da África.
Pré-Neolítico; 10 mil – 2 mil anos a.C. Crescimento populacional no Saara com marcante miscigenação entre os povos.
Neolítico: 3 mil – 500 anos a.C. O aumento da transmissão da malária acompanha a revolução agrícola e exerce possível pressão seletiva para o gene bS.
Neolítico Posterior: 2 mil – 500 anos a.C. A desertificação do Saara promove intensa migração populacional para todas as direções e, consequentemente ocorre a dispersão de gene bS.
Medieval: 700 anos d.C. século XV. Dispersão do gene bS para o sudeste e leste europeu.
Moderno: Séculos XV – XVIII. Dispersão do gene bS pelo tráfico de escravos africanos para as Américas e Caribe.
Contemporâneo: Século XIX.  Fase final do tráfico de escravos africanos (1850) e início da imigração européia para o Brasil. Tem início o processo de expressiva miscigenação da população brasileira.

Lembra das aulas de Biologia? _Mutação e Seleção Natural_

Origem e disperção do gene bs
Autor: Paulo Cesar Naoum

A mutação que deu origem à Hb S


    Estudos antropológicos associados às análises biomoleculares sugerem que o gene da globina bS, ou gene da Hb S, surgiu por um processo de mutação de bases nitrogenadas ocorrido entre 50 e 100 mil anos, abrangendo os períodos Paleolítico e Mesolítico. Esses mesmos estudos indicam a África como o local provável da ocorrência da mutação na fase coincidente à presença do Homo sapiens neanderthalis (há 100 mil anos) e do Homo sapiens sapiens (há 50 mil anos). A causa que motivou a troca de uma base nitrogenada (adenina) por outra (timina), cuja tradução molecular substituiu o aminoácido glutâmico pela valina na posição número 6 da globina beta, ainda permanece desconhecida. Se considerarmos as evidências científicas obtidas após as descobertas dos fósseis do H. sapiens neanderthalis e do H. sapiens sapiens nas regiões norte, centro e sul da África, é possível admitir que o processo da mutação que deu origem à Hb S foi multi-regional. Essa hipótese foi comprovada há pouco mais de dez anos através do mapeamento do cromossomo 11, especificamente da região do agrupamento de genes da globina tipo beta (e, gG, gA, yb, d e b). Por meio da análise de onze regiões polimórficas do agrupamento de genes de globina tipo beta, determinadas pela aplicação de enzimas capazes de quebrar ligações entre bases nitrogenadas específicas (enzimas ou endonucleases de restrição), foi possível concluir que o segmento cromossômico entre os genes e, g, d, e bS pode conter diferentes seqüências de bases nitrogenadas ou haplótipos que são específicas para determinadas populações ou grupos étnicos.
- Seqüência de polimorfismos do agrupamento de genes da globina bS no cromossomo 11. Caracterização dos cinco haplótipos: Senegal, Benin, Bantú, Saudita e Camarões.         Embora o produto final seja a síntese de Hb S, há pelo menos três grupos populacionais na África com segmentos cromossômicos diferentes e caracterizados pela disposição seqüencial específica de bases nitrogenadas; esses três grupos distribuídos em regiões geográficas distintas foram denominados por Senegal, Benin, Bantú. Além desses três grupos, dois outros grupos étnicos muito pequenos foram descritos por terem haplótipos diferentes daqueles já descritos, sendo um caracterizado em pessoas provenientes do sudeste de Camarões e o outro pertencente a uma tribo conhecida por homens do mato (Eton "people" ou Bushmen), caracterizando o haplótipo Camarões. Entretanto, a teoria da origem multicêntrica do gene da Hb S passou a ter considerável credibilidade quando identificaram outro haplótipo diverso dos quatro anteriores (Senegal, Benin, Bantú e Camarões) entre populações do leste da Arábia Saudita e em grupos tribais da Índia. Esse haplótipo de Hb S denominado por Árabe-Indiano está difundido notadamente em populações do leste da Arábia Saudita, Bahrain, Kuwait e Oman.
 – As prováveis três áreas (1: Senegal; 2: Benin; 3: Bantú) cujas populações foram afetadas pela mutação que deu origem à Hb S. A quarta área identificada por Árabe-Indiano fundamenta a suposição que a Hb S teve origem multicêntrica.
Uma outra questão a respeito da origem da Hb S se refere ao fato de que a mutação tenha ocorrido apenas uma vez, ou mais de uma vez. Alguns pesquisadores envolvidos neste assunto admitem que a mutação ocorreu apenas uma vez em uma determinada época entre os períodos Paleolítico e Mesolítico. Entretanto há três restrições que contrapõem essa hipótese: primeira: a mutação poderia ter ocorrido mais de uma vez, porém desapareceu da população por mecanismos semelhantes à deriva genética(a), ou ao fluxo genético(b), bem como à pressão seletiva(c); segunda: a mutação poderia ter aparecido mais que uma vez, porém no mesmo haplótipo – sendo, portanto, indetectável; terceira: as regiões polimórficas do gene da globina beta ainda não estão totalmente estabelecidas para afirmar categoricamente que a mutação tenha ocorrido apenas uma vez. a) Segundo o geneticista Brito da Cunha (1966), "as mudanças evolutivas geridas pela seleção natural são sempre adaptativas, o que não acontece com as produzidas pela deriva genética. Algumas vezes a deriva genética foi invocada para explicar diferenças de freqüências gênicas entre populações, quando não se via como os caracteres em questão pudessem apresentar valores adaptativos. Isto aconteceu também com as inversões. A demonstração posterior de importância adaptativa desses caracteres e das inversões tem sido um contínuo tema de debates. b) Fluxo gênico ou fluxo genético significa a entrada ou saída recorrente de genes de uma população por processos migratórios. c) Pressão seletiva se deve a um agente orgânico ou inorgânico que impede ou estimula determinado gene mutante. Por outro lado, o grupo de pesquisadores que supõe a múltipla ocorrência da mutação da Hb S se apoiam no fato da presença dos cinco haplótipos descritos até o presente, e assim propõe que a origem da Hb S se deu em cinco ocasiões diferentes, e foram favorecidas pelo efeito protetivo da Hb S em portadores heterozigotos frente à infecção do Plasmodium falciparum ( agente da Malária). Apesar do extraordinário desempenho das técnicas de biologia molecular no estudo dos haplótipos do gene da globina bS associados aos aspectos antropológicos e evolutivos, a questão da origem monocêntrica ou multicêntrica, bem como sobre o efeito protetivo da Hb S contra a malária, ainda permanece em discussão.


sábado, 6 de novembro de 2010

Histórico da Anemia Falciforme.


        A doença falciforme não é um privilégio da raça negra. Ela pode ocorrer em qualquer pessoa. A alteração responsável surgiu há milhares de anos na Ásia menor, como forma do organismo se defender da malária. Assim, aqueles que tinham o gene S, e os seus descendentes que tiveram a hemoglobina modificada geneticamente apresentam a capacidade de dificultar a evolução da malária em seu corpo, quando picados pelo mosquito infectado. No entanto, esta modificação teve um preço e, certos descendentes de filhos de pais com alteração parcial, sem sintomas e hígidos, geravam filhos com anemia e diversos outros problemas.
Com o decorrer do tempo, graças as grandes migrações, a África, principalmente as áreas tropicais e equatoriais, passou a ser o local preferencial da malária e os sobreviventes eram os que apresentavam as alterações da hemoglobina. Isto fez com que certas populações da raça negra da região se apresentassem com percentuais extremamente elevados de alteração na hemoglobina, mas adaptados ao seu meio e em convívio com a malária.
        Foram estes contingentes populacionais africanos, transportados como escravos ao nosso país, a partir do Século XVII, os responsáveis pela introdução do gene da hemoglobina S para os brasileiros. Hoje, encontra-se na população brasileira, que tenha ascendência negróide, dependendo da região do país, entre 6 a 10% de pessoas com o gene da hemoglobina S.
        Na maioria das vezes, estas pessoas são normais e assintomáticas. Mas em situações especiais ou críticas, de falta de oxigênio ou nas mulheres durante a gravidez, sintomas como infecções urinárias e um parto mais complicado pode ocorrer. O casamento entre portadores do gene, denominados como portadores do traço falcêmico, pode gerar a cada 500 nascimentos, uma criança com anemia falciforme.


Fonte: Departamento de Bioquímica da UNIFESP

Conhecendo a Anemia Falciforme.

Drepanocitose
   A drepanocitose é uma doença hereditária caracterizada por glóbulos vermelhos em forma de foice e uma anemia hemolítica crônica.
 
   Nos Estados Unidos, por exemplo, aproximadamente 10 % da população negra tem um gene da drepanocitose (apresentam um traço ou estigma drepanocítico); estas pessoas não desenvolvem a doença. Aproximadamente 0,3 % tem dois genes e desenvolve a doença.
   No Brasil não se pode focar a população negra como única a apresentar Anemia Falciforme pelo alto grau de miscigenação da população do país. 
   Na drepanocitose os glóbulos vermelhos apresentam uma forma anormal de hemoglobina (proteína que transporta o oxigênio) que implica uma redução da quantidade de oxigênio nas células e que os deformam, dando-lhes um aspecto de meia-lua ou de foice. Os glóbulos vermelhos em forma de foice obstruem e lesam os vasos mais pequenos que se encontram no baço, nos rins, no cérebro, nos ossos e em outros órgãos, reduzindo o fornecimento de oxigênio a esses tecidos. Estas células deformadas, como são frágeis, rompem-se à medida que passam pelos vasos sanguíneos, causando anemia grave, obstrução da corrente sanguínea, lesão em diversos órgãos e, por vezes, a morte.
Formas dos glóbulos vermelhos
Os glóbulos vermelhos normais são flexíveis, com forma de disco, e mais grossos na borda do que no centro. Em várias perturbações hereditárias, os glóbulos vermelhos tornam-se esféricos (esferocitose hereditária), ovais (eliptocitose hereditária) ou com forma de foice (drepanocitose).

 
Sintomas
   Os que sofrem de drepanocitose têm sempre um certo grau de anemia e de icterícia ligeira, mas podem apresentar outros sintomas. Contudo, qualquer fator que reduza a quantidade de oxigênio presente no sangue (como, por exemplo, o exercício ativo, o alpinismo, os vôos a grande altitude sem oxigênio suficiente ou uma doença) pode provocar uma crise de drepanocitose (um súbito agravamento da anemia), dor (muitas vezes no abdômen ou nos ossos compridos), febre e, por vezes, falta de ar. A dor abdominal pode ser intensa e a pessoa pode vomitar; os sintomas podem parecer-se com os que provocam a apendicite ou um quisto do ovário.
   Nas crianças, uma forma frequente de crise drepanocítica é a síndrome torácica, caracterizada por uma intensa dor no peito e falta de ar. A causa exata da síndrome torácica ainda é desconhecida, mas parece ser o resultado de uma infecção ou de um bloqueio num vaso sanguíneo em consequência de um coágulo ou de um êmbolo de sangue (uma parte de coágulo que se desprendeu e se alojou num vaso sanguíneo).
   A maioria das pessoas que sofre de drepanocitose apresenta um aumento do tamanho do baço durante a infância. Por volta dos 9 anos, o baço encontra-se tão afetado que se encolhe e deixa de funcionar. Como o baço ajuda a lutar contra as infecções, estas pessoas susceptíveis podem desenvolver pneumonia pneumocócica e outras infecções com mais facilidade. As infecções virais tendem a reduzir a produção de células sanguíneas, pelo que a anemia piora. O fígado aumenta de tamanho progressivamente ao longo da vida e formam-se cálculos biliares a partir do pigmento dos glóbulos vermelhos lesados. O coração habitualmente aumenta de tamanho e são frequentes os sopros cardíacos.
   As crianças que sofrem de drepanocitose costumam ter o torso relativamente curto, mas em contrapartida os braços, as pernas, os dedos e os pés são compridos. As alterações na medula óssea e nos ossos podem causar dor de ossos, sobretudo nas mãos e nos pés. Os episódios de dores articulares e febre são habituais e a articulação do fêmur pode sofrer uma lesão tão grande que, por fim, é necessário substituí-la.
   A falta de circulação na pele pode causar lesões nas pernas, sobretudo nos tornozelos. A lesão do sistema nervoso pode provocar ataques cerebrais (acidentes vasculares cerebrais). Em pessoas de idade mais avançada, as funções pulmonares e renais podem deteriorar-se. Os homens jovens podem sofrer ereções persistentes, muitas vezes dolorosas (priapismo).
   Em raras ocasiões uma pessoa com o traço drepanocítico pode apresentar sangue na urina devido a uma hemorragia no rim. Se o médico sabe que esta hemorragia está relacionada com um traço drepanocítico, pode evitar uma cirurgia exploratória desnecessária.

Diagnóstico
   A anemia, a dor de estômago e dos ossos e as náuseas costumam ser sinais suficientemente evidentes de uma crise de drepanocitose. Numa amostra de sangue examinada ao microscópio podem observar-se os glóbulos vermelhos em forma de foice e os fragmentos de glóbulos vermelhos destruídos.
   A eletroforese, uma análise de sangue, pode detectar uma hemoglobina anormal e indicar se uma pessoa apresenta apenas o traço drepanocítico ou então a própria drepanocitose. A identificação do traço pode ser importante para a planificação familiar, visto que determina o risco de se ter um filho com drepanocitose.

Tratamento e prevenção
   No passado, as pessoas que sofriam de drepanocitose geralmente não passavam dos 20 anos de vida, mas hoje em dia em geral vivem em boas condições para além dos 50 anos. Em raras ocasiões, uma pessoa que apresenta o traço drepanocítico pode falecer de forma repentina ao fazer um exercício que exija muito esforço e lhe cause uma desidratação grave, como pode acontecer durante um treino militar ou atlético. A drepanocitose não se cura, pelo que o tratamento é dirigido para a prevenção das crises, o controle da anemia e o alívio dos sintomas. As pessoas que sofrem desta doença devem evitar as atividades que reduzem a quantidade de oxigênio no sangue e devem consultar um médico imediatamente mesmo por doenças de importância menor, como as infecções virais. Como estes doentes correm maior risco de infecção, devem vacinar-se contra os pneumococos e o Hemophilus influenzae.
   As crises de drepanocitose podem exigir hospitalização. É administrada ao doente uma grande quantidade de líquidos por via endovenosa e medicamentos para aliviar a dor. O oxigênio e as transfusões de sangue podem ser prescritas quando o médico suspeita que a anemia é tão grave que pode criar o risco de um ataque cerebral, de paragem cardíaca ou de lesão pulmonar. Por outro lado, as doenças que podem ter originado a crise, como uma infecção, também devem ser tratadas.
   Os medicamentos para controlar a drepanocitose, como a hidroxiureia, encontram-se em fase de investigação. A hidroxiureia aumenta a produção de uma forma de hemoglobina que se encontra presente predominantemente no feto e que reduz a quantidade de glóbulos vermelhos que adotam a forma de foice. Portanto, reduz a frequência das crises de drepanocitose.
   A medula óssea de um membro da família ou de outro doador que não apresente o gene da drepanocitose pode ser transplantada para uma pessoa que sofre da doença, embora exista todo um protocolo a seguir. Mesmo que o transplante possa ser curativo, não está isento de riscos e o receptor (o que recebe a medula óssea) deve ingerir medicamentos que deprimem o seu sistema imunitário durante o resto da vida. A terapia com genes, uma técnica através da qual se implantam genes normais em células precursoras (células que produzem células sanguíneas), é uma forma de tratamento ainda em estudo.
Hemoglobinopatias C, S-C e E
   Só as pessoas que apresentam dois genes para a hemoglobinopatia C desenvolvem uma anemia de gravidade variável. As que sofrem esta doença, em especial as crianças, podem apresentar episódios de dor abdominal e das articulações, baço grande e icterícia ligeira, mas não sofrem crises graves. Em geral, há poucos sintomas.
   A hemoglobinopatia S-C afeta pessoas que têm um gene da drepanocitose e outro gene da hemoglobinopatia C. É mais frequente que a síndrome da hemoglobina C e os seus sintomas sejam semelhantes aos da drepanocitose, mas mais ligeiros.
   A hemoglobinopatia E afeta principalmente a população negra e a do Sudeste asiático; não é frequente nos Chineses. Esta doença produz anemia, mas nenhum dos outros sintomas que caracterizam a drepanocitose e a hemoglobinopatia C.

100 anos do 1º diagnóstico da Anemia Falciforme.


No dia 27 de outubro completaram-se 100 anos do primeiro diagnóstico da anemia falciforme. Walter Clement Noel (1884-1916),  nasceu em uma grande fazenda num país montanhoso, no extremo norte de Granada, uma pequena ilha do Caribe que na época era uma colônia britânica. Sua família era de fazendeiros ricos, Noel recebeu uma qualidade educacional muito boa e com a participação de Harrison College em Barbados, completando seus estudos de graduação no verão de 1904. Em setembro do mesmo ano, Noel partiu de Barbados para Nova York, durante a longa viagem, ele desenvolveu uma úlcera de perna (uma complicação comum da doença falciforme). Tinha vinte anos quando desembarcou em Chicago (EUA) para estudar estomatologia. Era um jovem de inteligência acima da média, com desejo enorme de entrar para o mundo da medicina. Certo dia, com menos de quatro meses de presença em território norte-americano, Walter Noel procurou ajuda médica no Presbyterian Hospital, acometido de queixas múltiplas, designadamente dispneia, palpitações, cardiomegalia, sopro sistólico e pulsos cheios. O jovem foi atendido pelo médico James Herrick, cardiologista, que na análise sanguínea feita ao paciente descobriu uma alteração física nos glóbulos vermelhos (que se viam ao microscópio em forma de foice, ao invés do seu habitual desenho arredondado). Este olhar lançaria definitivamente um novo e revolucionário conhecimento das Ciências Médicas: estava descrita a anemia falciforme, tal como se a percebe até aos dias de hoje. O médico norte-americano publicou as suas observações na edição de novembro daquele ano do Journal Archives of Internal Medicine.

Começando...

   No ano em que o primeiro diagnóstico da Anemia Falciforme completa 100 anos, resolvi escrever nesse blog com o intuito de ajudar a divulgar cada vez mais a doença para que seja mais conhecida pela sociedade, para trocar conhecimentos e experiências com os portadores da AF, já que sou também uma portadora da forma mais grave, uma SS.
   Meus pais começaram a descobrir meu problema quando eu tinha 7 meses, apresentei a síndrome mão-pé ou seja, DACTILITE FALCÊMICA (inflamação nas articulações causando inchaço nos pés e mãos acompanhado de dores e arroxeamento do local), ao "engatinhar" minhas mãos ficavam direto no chão e a friagem fazia esse sintoma aparecer. Fui levada a um médico particular que pedia exames, constatava a Anemia Falciforme, mas não acreditava que eu pudesse ter uma "doença de negros" sendo loira e com pais brancos.O médico era particular e vivia requisitando exames e renovando as consultas, por fim, meu pai não aguentou mais ter um diagnóstico em que o médico não acreditava e nada era feito, onde somente se gastava dinheiro. Fui então levada para o Hospital Menino Jesus, lá uma médica nos atendeu, pediu os exames e quando o resultado chegou confirmou o diagnóstico da Anemia Falciforme, mas teve a infeliz idéia de dizer para minha mãe que o fígado desses doentes com o tempo se desfazia ( Até na Medicina a ignorância sobre a doença ainda é grande). Minha mãe de resguardo do meu irmão, passou algum tempo com problemas de memória tal foi o susto que ela tomou, chegou a esquecer a data de nascimento dos filhos quando teve que abrir um prontuário médico. Para piorar mais, meu irmão também tinha a mesma doença ( meu irmão faleceu aos 25 anos com pneumonia, nunca aceitou, no seu íntimo, a Af embora, frequentasse todas as consultas e tomasse os medicamentos indicados. Vivia sempre tentando ultrapassar suas limitações).
   Fui transferida para o HEMORIO com 5 anos e  hoje com 39 anos continuo sendo paciente de lá.
   Tive uma criação consciente de minhas limitações, mas nunca fui colocada numa redoma de vidro. Fui incentivada aos estudos, a vencer os obstáculos, jamais desistir dos ideais, ser informada e lutar sempre. Filha de militar, tinha que seguir a risca essa "receita" de vida. Já da parte de minha mãe aprendia a orar e ter fé.
   Meus pais faziam de tudo para que as crises fossem as mínimas possíveis: boa hidratação, boa alimentação e exercícios físicos moderados para melhorar a oxigenação (toda folga do meu pai tínhamos que praticar caminhada, polichinelo e andar de bicicleta no solzinho da manhã, depois muito suco de laranja com beterraba e cenoura.).
   Pude estudar e quando ficava em crise pegava a matéria com os colegas, sofremos discriminação pela mãe de uma colega que foi a direção da escola reclamar que eu e meu irmão tínhamos os olhos amarelos (na verdade meu irmão tinha os olhos bem amarelos e fez com que ela acabasse observando os meus, que quase não se notavam) e devíamos estar com hepatite, não podendo estudar dessa forma com outras crianças, eu estava na antiga 1ª série e meu irmão na Classe de Alfabetização, minha mãe teve que comparecer a direção para explicações. Observei que minha coleguinha de sala pouco se aproximava de mim. Mas meus pais não deixaram que sofrêssemos com isso, nos contou essa história bem superficialmente na época, como se fosse uma simples dúvida que a mãe dessa coleguinha tinha.
   Segui em frente estudando... me formei professora, passei em concursos públicos, fiz faculdade de Biologia e hoje sigo trabalhando e continuo estudando, fazendo especializações, extensões em Biologia e programando um mestrado.